Quando o Espírito Santo se manifesta





As personalidades do mundo, especialmente os poderosos, reagiram como se a terra estremecesse quando se ouviu a frase: “A corrupção fede e não é de Deus! Ela é a responsável pela maioria dos males do mundo, inclusive pela criminalidade. Corruptos, vocês serão cobrados muito caro por esse pecado abominável da corrupção”. E mais adiante as autoridades de segurança e o crime organizado mundial balançaram quando ouviram: “A máfia é um mal a ser combatido a todo custo! O destino de quem a faz é o inferno. Mafiosos, ainda há tempo, convertei-vos a Cristo!” O autor dessas declarações que ressoaram na imprensa do mundo todo como bomba incendiária e chocou pelo ineditismo e coragem é um argentino de nome Jorge Mario Bergoglio. É o Papa Francisco, que revoluciona a Igreja Católica Apostólica Romana, trazendo-a para mais perto da Igreja de Atos dos Apóstolos, em que “os cristãos tinham tudo em comum e dividiam os seus bens com alegria” (Atos 2-44).

Jesuíta por formação sacerdotal, membro da Companhia de Jesus, ordem católica que se ressalta pela riqueza e intelectualidade de seus membros, Bergoglio não escolheu para nome papal o do fundador de sua ordem, Inácio de Loyola, mas outro nome - o do fundador de uma ordem bem diferente da sua, esta marcada pela simplicidade e pobreza, a Ordem Franciscana. Primeiro jesuíta a alcançar o trono de Pedro em 2000 anos, preferiu inaugurar um novo nome papal, Francisco I, ao invés de Inácio I, com certeza pelo motivo de sua eleição. Com o novo nome anunciava e iniciava a revolução que está fazendo na mais poderosa força política do mundo e na mais rica instituição existente no globo – a Igreja com sede em Roma.

Foi o único cardeal a chegar para o Conclave que para ir do aeroporto de Roma ao Vaticano, preferiu ir de trem como um popular qualquer. E o único a chegar a pé ao Vaticano e carregando ele mesmo sua própria bagagem. Os demais chegaram em carros de luxo e com comitiva de assessores. E encontrou a Cidade Eterna num torvelinho infernal após a inesperada renúncia do Papa Bento XVI, o outrora todo poderoso Cardeal Ratzinger, que assumira não ter forças para resolver os problemas da Igreja envolvida em escândalos que iam desde ameaças de morte a ele por cardeais poderosos com interesses contrariados, até homossexualismo e prostituição dentro do Vaticano; e o pior: escândalos financeiros astronômicos nas finanças da instituição financeira mais rica do mundo – o Banco do Vaticano, envolvido em negócios com lavagem de dinheiro para a máfia italiana e cartéis internacionais de tráfico de drogas e mais outros absurdos nada santos.

Eleito inesperadamente, pois os favoritos eram outros cardeais poderosos, conquistou os votos da maioria dos cardeais sem pedí-los, já que quase imploraram que aceitasse a missão, impressionando principalmente os clérigos dos continentes mais pobres como Ásia, África e América Latina, fazendo um discurso de que a igreja não tem que ter banco nem riqueza nem bens, que sua riqueza são os cristãos. E que a Igreja precisava sair de si mesma, abrir-se e voltar-se ao indivíduo, objeto maior de sua missão evangelizadora, conversora e salvadora. Conquistou a quase todos. Ganhou o ódio dos que querem uma Igreja de pompas e luxo.

E de lá para cá vem tendo atitudes reveladoras de sua missão revolucionária e transformadora. Em sua primeira missa de lava-pés, escolheu lavar e beijar os pés de 12 jovens drogados moradores de rua de Roma. Destronou clérigos conservadores poderosos de seus postos e disse que o padre ou bispo tem que viver na pobreza e basta de ostentação, afastando de suas funções um bispo alemão que gastou milhões de euros da Igreja em seu palácio episcopal. O próprio Francisco recusou-se a morar nos suntuosos aposentos do Palácio Apostólico, onde moraram até hoje todos os papas da contemporaneidade, e foi morar no Abrigo Santa Marta, um local do Vaticano para padres e freiras que já velhos e doentes não podem mais trabalhar, isto é: o Papa recusou o palácio e escolheu morar num asilo para velhos. Assim é o homem que mais influência política no mundo tem e que detém poder sobre a maior fortuna do mundo.

Quando estive em Roma há um ano atrás, 03 coisas me chamaram a atenção. Duas pela imprensa e uma presenciada pessoalmente. A imprensa italiana estava chocada com 02 fatos ocasionados pelo novo Papa. Primeiro descobriu-se que nas madrugadas ele estava se disfarçando de mero padre de batina preta e saia pelas ruas de Roma distribuindo sopa e agasalhos aos moradores de rua, sem nenhuma segurança, mesmo sendo Chefe de Estado; segundo, ele por aqueles dias havia ligado pessoalmente a uma católica argentina cujo pároco local se recusara a dar a comunhão a ela por ser divorciada, mandou-a retornar à Igreja de seu bairro e ligou ao padre dando ordens para dar a comunhão à mulher, mesmo contra os códigos canônicos. Alegou que Cristo pregou o amor e amor é acolhida e jamais rejeição! E que a igreja tem que se adaptar à nova dinâmica dos dias atuais. E presenciei na cerimônia de canonização de João Paulo II e João XIII, em 27 de abril passado no Vaticano, 02 papas com histórico de reformadores que ele escolheu para torná-los santos no mesmo dia, por determinação papal o alto estava clero todo vestido simplesmente como meros padres paroquianos e o próprio Francisco também; isso na presença de chefes de poder e de estado de quase todos os países do mundo ali presentes, reis, rainhas, príncipes e sultões, primeiros-ministros e presidentes de Repúblicas.

De lá pra cá, ele chocou o clero conservador quando no local mais sagrado e famoso do Vaticano, a Capela Sistina, batizou filhos de prostitutas, de mulheres divorciadas e de mães solteiras. Criou comissões para combater e impedir o tráfico de pessoas no mundo, a venda de seres humanos para a prostituição e transplante de órgãos, enfrentando poderosas e perigosas quadrilhas e máfias internacionais. E por último foi o articulador político do restabelecimento das relações diplomáticas entre os Estados Unidos e Cuba, ocorrido e selado recentemente com o encontro formal de Obama e Raul Castro na Cúpula das Américas no Paraná na semana passada, depois de 50 anos desses 02 países estarem de relações diplomáticas rompidas. Tudo isso era inimaginável até 02 anos atrás.

Antes as pessoas iam a Roma para ver João Paulo II. Depois iam para ouvir Bento XVI. E agora vão para ABRAÇAR Francisco.

Com tais atos que só podem ser de inspiração divina e manifestação plena do Espírito Santo, Francisco mostra que a Igreja na sua trajetória histórica se desviou do seu foco principal – o cristão, autocentrou-se, preocupou-se em acumular poder e se afastou dos seus fiéis e com isso perdeu credibilidade e adeptos. É ainda hoje a instituição política e financeiramente mais poderosa e influente no mundo (qual religião tem seu chefe reconhecido pela ONU como Chefe de Estado e sua sede como país?), mas em seu próprio público patina no descrédito. Ele quer fazer voltá-la aos seus primórdios, como lá em Atos, fazendo uma igreja verdadeiramente do Cristo, Aquele que veio para os humildes, fracos, oprimidos e marginalizados; para buscar e salvar o que estava perdido e pregou a maior e mais revolucionária mensagem como seu único mandamento, que praticado não precisaria de nações diferentes nem leis: o amor!

Bergoglio é isso! A personificação do amor ao próximo para trazer a Igreja de volta aos seus verdadeiros donos: os cristãos! E foi o Espírito Santo que o escolheu, o inspira e o usa para isso!



Allan Roberto Costa Silva, médico, ex-Vereador-Presidente da Câmara Municipal de Pedreiras, membro da Academia Pedreirense de Letras-APL e da Associação de Poetas e Escritores de Pedreiras-APOESP. E-mail: arcs.rob@hotmail.com

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