Justa remuneração

Causou um pouco de rebuliço e alguma indignação na cidade a notícia de que os vereadores estavam reajustando seus salários (subsídios, na linguagem técnica) para a legislatura que se iniciará em janeiro, assim como o do novo prefeito, vice-prefeito e secretários. Não deve haver motivos para esses movimentos e sentimentos da população, pois esse reajuste é imperativo legal imposto pela Constituição Federal em seu artigo 39. Além disso, é justo que o ocupante de cargo público eletivo ou de confiança seja remunerado e bem remunerado, até para não correr a tentação da corrupção.

O artigo 39 da Constituição Federal-CF em seu parágrafo quarto, assim como o artigo 37 em seus incisos X e XI impõem e preveem que esses subsídios sejam fixados por lei específica de autoria da Mesa Diretora da Câmara. No caso dos vereadores, o projeto de lei deve tramitar e ser aprovado ainda antes da eleição para não ferir o “princípio do legislar em causa própria”, isto é, alguns vereadores reeleitos quererem majorar o subsídio porque sabem que estarão lá de volta e se beneficiarão do gordo novo subsídio. Já o dos membros do Executivo, prefeito, vice, secretários etc, pode tramitar a qualquer momento, mesmo depois da eleição, para não ferir o “princípio da remunerabilidade do agente público”, isto é, o agente público tem que ser bem remunerado e seu subsídio não pode ficar defasado. Tudo isso não é só ideia minha, não. São previsões legais e princípios constitucionais e do Direito.

A Câmara Municipal de Pedreiras apresentou e iniciou tramitação em 11 de julho do corrente ano, de autoria da Comissão de Finanças, Orçamento e Tributação, o Projeto de Decreto Legislativo Nº 022/2012, que fixa o subsídio mensal dos vereadores para a legislatura 2013/2016. A comissão é composta pela presidenta vereadora Ceiça, pelo relator vereador Antônio França e pelo membro vogal vereador Cearense. O projeto prevê subsídio de R$ 6.000,00 mensais, que segundo reza a matéria legislativa, está dentro do teto constitucional de até 30% do subsídio do deputado estadual, que é de R$ 22.292,34 em valores brutos e R$ 17.027,53 em valores líquidos. O projeto foi aprovado na íntegra, sem emendas, pelo plenário da Câmara em 09 de novembro último, já após a eleição, e deu origem ao Decreto Legislativo Nº 024/2012 baixado pelo presidente Otacílio Fernandes.

Ora, está tudo errado. Erraram aqui a assessoria jurídica da Câmara de Vereadores e a Mesa Diretora, que não se atentaram para a previsão da Constituição Federal de que a matéria legislativa e ato legal para o caso seria projeto de lei e lei e não projeto de decreto legislativo e decreto legislativo. Seguiram eles a Lei Orgânica Municipal que está defasada e deixaram de seguir a Constituição Federal, lei máxima, e atualizada (o artigo 39 da CF foi emendado em 1998 pela emenda constitucional nº 19). Portanto, legalmente nula foi a decisão dos vereadores de reajustar e fixar o novo subsídio para a próxima legislatura.

E outro erro crasso nessa questão: usaram “Decreto Legislativo” para atingir objetivo exclusivamente interno do Legislativo, como é o caso do subsídio de vereadores. Está errado. A técnica legislativa define o “Decreto Legislativo” como a matéria legislativa ou ato legal legislativo para atingir objetivo extra-legislativo, fora, em outro poder, como por exemplo, a cassação do prefeito, a concessão de uma honraria a alguém que não faz parte do conjunto de vereadores etc. Se pelo menos tivessem feito por “Projeto de Resolução” ou “Resolução”, como era antes, aí sim, estaria errado do mesmo jeito, mas não tão feio, pois a técnica legislativa define a “Resolução” como o ato legal que atinge objetivo exclusivamente interno da Câmara... Vamos estudar, vereadorzada!!! No final do mandato e vocês ainda não sabem quais são as matérias legislativas existentes e a que serve cada uma?...!...

Já para os subsídios do novo prefeito, vice e secretários, iniciou tramitação na Câmara Municipal o projeto de Lei Nº 009/2012, de 30 de outubro, fixando em R$ 18.000,00, R$ 9.000,00 e R$ 5.500,00 os subsídios desses agentes públicos, respectivamente. A matéria é de autoria da Mesa Diretora composta pelo Presidente Otacílio Fernandes, pelo vice-Presidente David Leite e pelo Secretário Ribamar da Dra. Mírian. Ainda tramita e não foi ainda a votação em plenário. Neste, portanto, tudo ainda pode acontecer.

Em minha opinião ambas as matérias também estão incompletas, além de uma errada e outra correta, porque deviam constar também a fixação dos valores de diárias de viagens a serviço dos poderes e suas diferenciações entre os valores e cargos e os valores para dentro e fora do estado.
O importante é ressaltar que esses agentes devem ganhar bem mesmo para não precisar se corromper. Mas que cumpram sua função. A atual legislatura, com os erros cometidos nesse caso aqui demonstrado, evidencia que não cumpriu seu papel com o esmero esperado.
Quando eu assumi a Presidência da Câmara em 01/01/2001, encontrei o subsídio do Presidente da Câmara fixado em R$ 12.500,00. Achei demais. E até absurdo para uma cidade em que a maioria da população vive de salário mínimo e outra grande parte nem o mínimo tem. Considerando que sou médico e continuaria a exercer minha profissão concomitante a vereança e a Chefia do Legislativo, reduzi por Resolução meu subsídio para R$ 7.500,00 e não fiz alarde disso para me beneficiar com propaganda positiva. E cumpria expediente diário em meu gabinete nos dois biênios de presidência. Aprendi lá que se quiser, tem muito que se fazer e até tempo vai faltar para se fazer o tanto que nosso povo precisa. Mas ficar achando que ser vereador é só ir às sessões uma vez na semana, receber subsídios e beneficiar-se das mamatas, aí já é triste demais e é por isso que o povo reclama quando ouve falar em aumento de salário para político.

Allan Roberto Costa Silva, médico, ex-Presidente da Câmara Municipal de Pedreiras, membro da Academia Pedreirense de Letras e da Associação dos Poetas e Escritores de Pedreiras – APOESP.

                                                  

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